A jornalista canadiana Eva Bartlett tem uma outra versão do conflito sírio, com base no que viu e ouviu nas suas visitas ao país.Também um embaixador britânico, em declarações públicas, condena as linhas diretivas da diplomacia do Reino Unido na Síria.
Desde que o conflito se iniciou em 2011, a jornalista canadiana Eva Bartlett foi à Síria pelo menos três vezes – as primeiras duas sozinha e a última com mais 12 jornalistas ocidentais. Com base no que viu com os seus próprios olhos e no que ouviu dos sírios, em diferentes zonas do país, defende que “os meios de comunicação social estão a mentir”.
Durante uma conferência, organizada pela Missão Permanente da República Árabe da Síria na ONU, e em resposta a um jornalista do Aftenposten, que lhe perguntou que incentivos teriam os media ocidentais para fazer falsas notícias e por que estariam as organizações internacionais no terreno a mentir, Eva começou por dizer que há “certamente jornalistas honestos entre os meios de comunicação muito comprometidos” e que, em relação a organizações internacionais no terreno, mais concretamente no leste de Alepo, ela não observou nem uma.
Essas organizações, segundo a jornalista, estão confinadas ao Observatório Sírio para os Direitos Humanos – localizado no Reino Unido – e a grupos comprometidos, como os capacetes brancos, fundados em 2013 por um ex-oficial militar britânico e financiados pelos EUA, Reino Unido e resto da Europa.
Enquanto os capacetes brancos dizem pretender “resgatar civis no leste de Aleppo e Idlib, ninguém no leste de Alepo ouviu falar deles, e eu digo ninguém, tendo em mente que agora 95% dessas áreas do leste de Alepo estão libertadas”. Ao mesmo tempo, “os capacetes brancos pretendem ser neutros, e ainda assim eles podem ser encontrados a carregar armas e de pé sobre os cadáveres dos soldados sírios”. E acrescenta que as imagens de vídeo deste grupo, que contêm crianças, foram “recicladas”, podendo encontrar-se uma rapariga chamada Aya num relatório de agosto que aparece no mês seguinte em dois locais diferentes. “Não são credíveis. Os ativistas sem nome não são credíveis, uma ou duas vezes talvez, mas cada vez mais não são credíveis. Então, não existem fontes no terreno”, garante Bartlett.
Quanto à agenda de alguns media de referência, como The New York Times, a jornalista questiona como é possível manterem, até agora, que esta é uma guerra civil na Síria e que os protestos não foram violentos até 2012. E ainda questiona: “Como podem insistir que o governo sírio está a atacar civis em Alepo, quando cada pessoa que está a sair dessas áreas ocupadas por terroristas está a dizer o oposto?”.
De acordo com Eva, a agenda dos media não espelha a realidade na Síria porque “se dissessem a verdade desde o início, não estaríamos aqui agora, não teríamos visto tantas pessoas mortas”. Em relação a outras falhas na cobertura jornalística, incluindo os supostos ataques aéreos a hospitais, Bartlett dá outro exemplo de manipulação. Em abril deste ano, foi noticiado por vários media que um hospital chamado Al-Quds Hospital foi atacado e ficou seriamente destruído pelas forças do regime sírio ou russas. A jornalista afirma que as imagens de satélite mostram que este hospital estava no mesmo estado que estava em outubro de 2015. “Não há diferença, não foi atacado”. E lembra que “meses depois, o The Guardian, um jornal britânico proeminente, disse na verdade que o hospital Al-Quds, que havia alegado meses antes ter sido atacado e destruído, tratava as vítimas dos ataques com armas químicas”.
O Major General Igor Konashenkov, do Ministério da Defesa russo, em declarações aos jornalistas, esta segunda-feira, diz ter encontrado valas comuns com dezenas de sírios torturados e assassinados em Alepo, depois da evacuação dos rebeldes da cidade. Diz também que até ao momento não foi encontrado nenhum “capacete branco” ou outra força civil e voluntária dedicada ao resgate de civis.
Também Peter Ford, ex-embaixador do Reino Unido na Síria (de 1999 a 2003), disse ao britânico The Independent que o Ministério dos Negócios Estrangeiros, liderado agora por Boris Johnson e antes por Philip Hammond, mentiu sobre a guerra na Síria. Ford afirma que o Reino Unido interpretou erradamente a situação no país desde o início do conflito. De acordo com o diplomata, o Reino Unido afirma falsamente que o governo de Bashar Assad não controla o país quando, pelo contrário, “ele está prestes a fazê-lo”. “Bashar Assad não é essa pessoa definida pelos media ocidentais”, afirma, acrescentando que o presidente sírio está no caminho certo. Refere também que os media mentiram ao dizer que “a morte de Assad era iminente”, assim como que “a oposição é dominada pelos ‘moderados’ “, quando se veio a comprovar, segundo ele, que tal não é verdade.
O diplomata admite que a política do Reino Unido tem “agravado a situação” na Síria. Explica que quando o conflito começou, o Reino Unido deveria ter investido as suas próprias forças no terreno, ou então não deveria ter encorajado a campanha da oposição ao regime de Assad.
Boris Johnson disse, depois de uma reunião em Paris no início deste mês, que não poderia haver solução militar para a guerra na Síria, ao mesmo tempo que o Reino Unido tem consistentemente defendido que Assad não pode ser uma parte do futuro da Síria. Um porta-voz do Ministério das Rεlaçõεs Externas disse: “O Reino Unido continua a acreditar num acordo político liderado pela Síria. Uma solução política e transição de Assad é a única maneira de acabar com o sofrimento do povo sírio. O regime de Assad tem o sangue de centenas de milhares de pessoas nas suas mãos. Não há nenhuma maneira de poder unir e trazer estabilidade à Síria.”
Estas declarações acontecem numa altura em que Barack Obama anuncia o levantamento de algumas restrições de armamento, o que permite aos EUA entregar mísseis antiaéreos portáteis aos rebeldes.
Fonte: Visão