O Serviço de Informações de Segurança (SIS) reconhece que há ameaças do Daesh contra Portugal, mas no quadro geral da Península Ibérica. Admite porém, que houve uma situação em que a ameaça foi direta.
O relatório anual da Europol sobre as as tendências das atividade terroristas em 2015/2016, divulgado esta terça-feira, alerta para a existência nesse ano de “recorrentes ameaças do Estado Islâmico (EI) contra a Península Ibérica e contra os Estados europeus que fazem parte da coligação militar” que combate o EI
Questionado pela imprensa sobre a veracidade da existência de “ameaças recorrentes”, o diretor do SIS, Neiva da Cruz , salienta que a “menção que o Daesh faz a Portugal tem sido, em regra, inserida no contexto da referência genérica de reivindicação do al Andalus pela organização terrorista”. Al Andaluz foi o nome dado à Península Ibérica, quando este território foi ocupado pelos mouros no século VIII. Contudo, este alto dirigente das secretas portuguesas reconhece que foi registada uma ” menção ao nosso país através da apresentação, num vídeo de difusão da mensagem jihadista, da bandeira nacional inserida no conjunto de bandeiras de países que integram a coligação contra o Daesh”.
Outra ameaça contra a Portugal foi também divulgada este ano, mas, depois de analisada, foi desvalorizada pelas autoridades portuguesas que monitorizam e investigam o terrorismo. Chegou pouco depois do atentado no aeroporto da capital belga, em Março.
“Hoje foi Bruxelas e o seu aeroporto, amanhã pode ser Portugal e a Hungria”, foi escrito num artigo do Al-Walfa, o órgão de propaganda do EI.
Secretas e PJ avaliaram a situação, em conjunto com congéneres europeus e norte-americanos e concluíram que não se tratava de uma ameaça concreta ao nosso país, mas uma forma do EI dizer que o seu braço armado podia chegar a qualquer ponto do globo. Essa foi, aliás, também a leitura de um organismo dos EUA que monitoriza os media jihadistas, o Middle East Media Research Institute: “Isto quer dizer que nenhum país europeu está a salvo dos ataques do EI”.
No seu relatório anual de 2015, os serviços de informações, assinalam a presença no conflito Síria / Iraque de “cidadãos nacionais cujos processos de radicalização violenta ocorreram fora do país”, salientando que “a possibilidade do seu retorno à Europa, ou a território nacional, não deixa de representar um sério risco para a segurança interna comum e nacional”.
Terá sido um desses luso-jihadistas , Steve D.A.(que adotou o nome de Abu Muhadjir Al Andalousi), filho de portugueses de Aveiro, emigrados no Luxemburgo que estará na Síria desde 2014, a protagonizar um vídeo a ameaçar a Península Ibérica. “Oh querida Al Andaluz! Pensaste que te tínhamos esquecido. Juro por Deus que jamais o fizemos. Nenhum muçulmano pode esquecer Córdova, Toledo e Xátiva (Valência). Há muitos muçulmanos sinceros e fiéis que juram recuperar Al-Andalus”, dizia.
O Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT) não ficou surpreendido com as ameaças ao Al Andalus, mas reduz o risco sobre Portugal em concreto. “Não é novo que uma das ambições estratégicas dos jihadistas é formar um grande califado que inclua o antigo Al Andaluz, de que fez parte Portugal”, afirma o presidente do OSCOT, António Nunes. Porém, sublinha, “o risco em relação a Portugal é menor do que em relação a países como a Espanha, a França ou a Itália, ainda com fortes influências no norte de África. Portugal não está na primeira linha por várias razões: não temos participado de forma direta nas coligações que atacam o EI, não tem uma forte comunidade muçulmana nem esta serve de base de apoio a potenciais terroristas, não tem jihadistas extremistas, não tem valor estrutural, económico e social”.
Lembrando que “nenhum país tem risco zero”, António Nunes pensa que este “alerta” da Europol deve ser entendido como “um sério aviso aos países, como Portugal, para que mantenham um nível elevado de organização policial e de intelligence, de modo a terem uma rede que permitam alertas precoces sobre potenciais atentados e se consiga ou evitá-los ou, na pior das hipóteses, minimizar as consequências”.
Isto implica, por exemplo, diz o presidente do OSCOT, “tomar medidas concretas como o reforço da vigilância nos aeroportos, a monitorização das comunidades muçulmana ou um maior controlo dos imigrantes que entram ilegalmente em Portugal”.
A organização e preparação para o combate e a prevenção do terrorismo tem sido um dos pontos fracos do nosso país. A Estratégia Nacional de Combate ao Terrorismo só foi aprovada no ano passado, 10 anos depois da europeia. Desconhece-se a execução de medidas ali previstas, como são os planos de prevenção da radicalização e a proteção das infraestruturas críticas.
Esta quinta-feira deverá ser aprovada em Conselho de Ministros a primeira medida concreta prevista na Estratégia, que é o reforço em meios humanos, materiais e de competências da Unidade de Coordenação Antiterrorista (UCAT). Está previsto que os peritos das secretas, da PJ, da PSP, da GNR, do SEF e da Polícia Marítima, além da troca de informações que era feita até agora em reuniões de periodicidade apenas semanal, passem a integrar uma estrutura permanente, com o objetivo também de coordenar a execução da Estratégia Nacional.
Esta medida foi anunciada pelo primeiro-ministro, António Costa, durante a visita, na terça-feira, do presidente francês, François Hollande, em que a Segurança Europeia esteve na agenda.